Com aplicativos de frete, caminhoneiro perdeu poder de barganha

Publicado em
19 de Março de 2019
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Ex-líder da categoria e assessor no governo federal, Fábio Roque diz que tecnologia favoreceu contratantes do serviço de transporte

Os aplicativos transferiram o poder de barganha na negociação do frete do caminhoneiro para os contratantes de transporte. Antes, quem precisava do serviço tinha de correr atrás dos motoristas espalhados pelas estradas de todo o País. Hoje, a distância entre quem contrata e quem executa o transporte é de apenas um clique, o que transformou a negociação do frete em um verdadeiro leilão. O caminhoneiro que cobrar menos leva.

Esse é o raciocínio do gaúcho Fábio Roque, ex-líder caminhoneiro que hoje atua como assessor na Secretária Nacional de Inclusão Produtiva e Urbana do Ministério da Cidadania. “Antigamente, o caminhoneiro viajava dois ou três dias até seu destino, aguardava a descarga e tinha de sair em busca de novo frete para voltar para casa. Não havia celular e ele usava ficha telefônica para tentar achar carga. Muitas vezes o orelhão não funcionava e a viagem de volta atrasava”, recorda Roque. Embarcadores e agenciadores montavam escritórios nos postos de rodovia para atender o caminhoneiro.

A distância em relação ao motorista obrigava o contratante a oferecer valores mais atrativos para o frete. “A transportadora passava a carga para três ou quatro agenciadores que tinham sede nos postos de beira de estrada. Em alguns casos, entrava mais uma figura, a dos chapas. Eram pessoas que faziam serviços de descarga e tinham como bico arrumar carga para caminhoneiros”, conta. No final da linha, o motorista tinha mais força para negociar o frete.

Com a chegada dos aplicativos, tudo mudou. “Embarcadoras, transportadoras e agenciadores publicam suas cargas na rede e quem corre atrás delas é o caminhoneiro. Em fração de segundos, uma mesma carga é compartilhada por 20 mil caminhoneiros”, ressalta.  O motorista perdeu o poder de barganha.

Os aplicativos, segundo Roque, também desmotivaram as empresas de transporte a manterem frota. “Aumentou a subcontratação de caminhoneiros autônomos e empresas de pequeno porte devido à facilidade de conexão com o motorista. Até mesmo os antigos chapas se tornaram ‘empreendedores’ adquirindo notebooks para intermediar a carga”, alega.

Até ganharam o apelido de “transsovaco”, pois não têm escritório, nem funcionário, não pagam aluguel, nem imposto. Com um computador embaixo do braço, diz o gaúcho, levam uma fatia do rendimento do caminhoneiro, que precisa comprar veículo, dar manutenção, pagar seguro, ficar sujeito a multa e rodar 16 horas por dia.

Por isso, Roque defende a necessidade do piso mínimo de frete. “É uma medida social para o transporte rodoviário de cargas”. As tabelas, lembra o assessor, foram uma reivindicação dos caminhoneiros atendida pelo governo na greve de maio do ano passado. Assim que o piso mínimo foi implantado, a categoria “sentiu o gosto de trabalhar com rentabilidade, começou a dar manutenção no caminhão, comprar pneus novos e até diminuir o ritmo das viagens”.

Mas a alegria durou pouco.  Embarcadores e transportadoras iniciaram uma guerra jurídica contra a lei 13.703, que estabeleceu as tabelas. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) não está fazendo o papel fiscalizador, alegando falta de estrutura e de pessoal. “Isso vem causando um desconforto na categoria, que se sente enganada pelo governo”

De acordo com Roque, há relatos de caminhoneiros que já apontam para uma nova greve. “A categoria apoiou o candidato Jair Bolsonaro e está se sentindo abondada pelo governo dele.” A Petrobras voltou a praticar a política de preços internacionais e o valor do diesel não para de oscilar. “Há quem diga que a situação está pior do que antes da greve.”

O assessor diz que ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, tem buscado soluções para o problema, mas o risco de paralisação é real.

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