Reforma administrativa: panaceia ou solução?*

Publicado em
11 de Setembro de 2020
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Artigo escrito por Paulo Roberto Guedes – 11.09.2020
 
Em meu último artigo (“Neste momento delicado da vida nacional é necessário discutir o essencial”), publicado dias 17.08 e 01.09, respectivamente nos sites do Guia do TRC e da Tecnologística, eu comentei que providências urgentíssimas, tais como as reformas administrativa e tributária, bem como os programas de privatização e de revisão de subsídios e benefícios fiscais, somente eram tratadas de forma oportunista e sem a profundidade e imparcialidade exigidas (1). O noticiário das últimas semanas fortaleceu ainda mais esse meu entendimento, motivo pelo qual acredito ser interessante retomar o assunto. Iniciemos com a Reforma Administrativa, recentemente enviada pelo Executivo ao Congresso Nacional.
 
Para desenvolver melhor este texto, faço duas observações que considero importantes: a primeira se ocupa com O QUE e a segunda do COMO. 
Primeira observação: está claro que o problema não se limita apenas às discussões – necessárias e urgentes, diga-se de passagem - de salários, cargos ou carreiras funcionais. Nesta época em que se discute mais ou menos intervenção estatal, e se for para valer, antes de mais nada é fundamental que se discuta que papel, nós brasileiros, queremos que o Estado desempenhe. Respeitando-se o que estabelece a Constituição brasileira e os princípios e valores de um Estado Democrático de Direito, é preciso saber o que queremos (ou esperamos) do poder público, pois esse é o caminho único para dimensionarmos mais corretamente, não só o tamanho do Estado, mas também as atividades que lhe correspondem para, com eficácia, alcançar seus objetivos. Portanto, uma discussão complexa, que impacta direitos e deveres de todos e cuja resposta somente poderá ser buscada através da Política, num debate amplo, aprofundado e que tenha participação de toda a sociedade.
 
Segunda observação: é importante destacar que qualquer reforma administrativa que se faça no Brasil, além dos objetivos já conhecidos, tais como modernização da máquina pública, aumento da eficiência, menor custo e menor gasto (2), combate à desigualdade no tratamento dado aos servidores, como também ao restante da população (3), aumento da transparência, desburocratização etc., é preciso entende-la como essencial para a melhoria da governança estatal (4) e da qualidade dos serviços prestados, posto que por eles paga-se muito. E sempre através de discussões transparentes, isentas, com a profundidade necessária (5) e o compromisso inegociável para, quando necessário, implantar a regulamentação complementar correspondente, pois como bem lembra a pesquisadora do IBRE/FGV, Juliana Damasceno, esse tipo de erro é muito comum no Brasil, pois a falta de regulamentação de uma determinada lei, poderá impedir sua concreta funcionalidade e/ou vigência. Embora esteja contemplado pela Constituição de 1988, a possibilidade de se demitir servidor público em caso de mau desempenho, por falta de regulamentação, essa providência jamais “foi para valer”.  
 
Com relação à proposta de Reforma Administrativa (sic) recentemente encaminhada ao Congresso Nacional, é conveniente considerar dois outros pontos importantes: a) apenas superficialmente, ela faz sugestões referentes ao COMO, sem sequer abrir espaços para discussões com relação ao O QUE; b) diferentemente de outras, essa proposta foi entregue no Congresso em uma cerimônia simples e sem as presenças do Presidente da República e do Ministro da Economia. Acho que quer dizer alguma coisa, posto que por diversas vezes o presidente Bolsonaro disse que não a encaminharia neste ano. Na verdade, as ordens, expressas, sempre foram no sentido de ‘empurrar’ para à frente, pois quem é candidato à reeleição, no sistema político atual, jamais se propõe a contrariar os interesses das poderosas classes de funcionários públicos, notadamente da esfera federal e dos poderes judiciário e legislativo.
 
Mesmo os presidentes da câmara e do senado (também candidatos ‘velados’ à reeleição), que constantemente fazem discursos à favor da reforma, não podem ser levados ‘muito à sério’, pois estariam indo contra seus próprios princípios (querem manter tudo como está) e dos interesses de seus ‘eleitores’.
 
Consequentemente, se for para “inglês ver”, ou “politicamente viável”, como disse o ministro da economia, seja lá o que isso queira dizer, que não se faça. Aliás, como defende a pesquisadora do IBRE/FGV, Juliana Damasceno: “diante do baixo impacto fiscal dessa proposta, pois afeta apenas futuros servidores, talvez seja mais conveniente resolver outros problemas, pois “o governo falou que estava fazendo agora para fazer economia fiscal. Só que a proposta não tem efeito no curto e médio prazos”.
 
E é o que parece ser essa proposta: tímida, direcionada (6), não mexe nos tais ‘direitos adquiridos’, principalmente nos privilégios das classes de funcionários públicos ‘selecionadas’ (7), valendo somente para as novas contratações, e longe das exigências que se fazem, pois pouco impacto tem sobre os déficits públicos atuais. Vale destacar a pressão do presidente da República no sentido de proteger os atuais funcionários da máquina pública, bem como aqueles que compõem o seu atual e principal ‘cinturão’ de proteção: militares, policiais e representantes dos poderes judiciário (8) e legislativo que, como sabemos, sabem muito bem como ‘reivindicar’. Mais do que isso, como se proteger (9). A jornalista e economista Ana Carla Abrão em artigo publicado no Estadão de 18.02.20, a respeito da reforma administrativa, escreveu: “A deterioração da qualidade do serviço público no Brasil não é culpa do servidor, mas sim do modelo que foi forjado por décadas de pleitos defendidos – e alcançados – por cada categoria (grifos meus). O problema não está no pleito – muitas vezes legítimo –, mas sim no seu atendimento sistemático e pleno por quem deveria zelar pelo interesse do todo e não apenas dos mais loquazes” (grifos meus). A essa verdade eu só complementaria, logo depois “dos mais loquazes”, e que se constituíram, ao longo do tempo, em um dos principais pilares para a manutenção do poder.
 
Por outro lado, se há alguns méritos na proposta, um deles é que ela abrange “servidores públicos” nas três esferas públicas, federal, estadual e municipal, em todos os três poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, e acaba com alguns dos ‘penduricalhos’ que, reconhecidamente, são indevidos, injustos, e porque não dizer, imorais, e portanto inaceitáveis em qualquer situação, notadamente em épocas como a atual (10). Infelizmente porém, a proposta não atinge os “agentes públicos” (juízes, magistrados, deputados, senadores, procuradores, ministros dos tribunais e militares), posto que são disciplinados por regras específicas (11). 
 
É o caso dos militares que, por seguirem regras próprias e à semelhança do que ocorreu na Reforma da Previdência, foram novamente ‘preservados’. “Nós não temos hora extra, não temos Fundo de Garantia, não tem um montão de coisa. A estabilidade é com dez anos de serviço, não com três, está certo?”, disse o presidente Bolsonaro em sua ‘live’ semanal. Segundo ranking elaborado pelo SIPRI (Instituto de Pesquisa para a Paz Internacional, de Estocolmo), o Brasil em 2019 ficou na 77ª posição entre os países que mais gastaram com Defesa Nacional, quando medido em percentual do PIB (1,417%). Ainda de acordo com a pesquisa, aqueles que mais gastam, geralmente, são os países envolvidos em conflitos ou localizados em zonas de tensão, como o Oriente Médio. Mas o mais interessante é que estudos do IFI (Instituição Fiscal Independente, vinculado ao Senado Federal), indicam que o Brasil, na comparação com os países que integram a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), está entre as três nações que, proporcionalmente, mais gastam com salários e pensões para militares. Nesse quesito, em 2019, o Brasil aparece atrás apenas da Grécia e da Croácia. Foram 74,3% de todos os gastos do Ministério da Defesa, cerca de R$ 76,1 bilhões. Gastos com compra de equipamentos, por exemplo, foram apenas R$ 12,8 bilhões. Pois é! 
 
O que se nota, preliminarmente, é que o problema não está diretamente na quantidade de funcionários existentes (12), mas sim nos níveis salariais praticados, bem como nos diversos “penduricalhos” criados ao longo do tempo. O funcionário público, comparando-se apenas salários em funções similares, ganha 8% mais do que a média do trabalhador do setor privado. O Banco Mundial, ao analisar 53 países, mostra que esse percentual chega a 21%. E analisando-se por esfera de governo, percebe-se que o funcionário público federal é o grande privilegiado, pois esse percentual chega a 96%! Enquanto para o funcionário estadual o percentual é 16% e o municipal é zero.
 
Entre os três poderes, pela ordem, os grandes privilegiados são o judiciário e o legislativo. Segundo dados de 2019 do IPEA (Atlas do Poder Público), no poder executivo, apenas 15% dos funcionários recebem mais do que R$ 5 mil de salário por mês. No legislativo, mais de 35% e no judiciário, mais de 85%. Segundo dados publicados pelo Conselho Nacional de Justiça, ainda no mês de agosto, o Poder Judiciário brasileiro, em 2019, custou R$ 100,2 bilhões (1,405% do PIB), sendo que gastos com salários, auxílios, benefícios e aposentadorias consumiram 90,6% deste total. Desse total, as pensões chegaram a R$ 18 bilhões.
 
Justificando melhoria no nível de ‘governança’, a proposta também prevê ampliação do poder do presidente, posto que mesmo sem aprovação antecipada do Congresso, ele poderia extinguir órgãos e cargos (inclusive transformá-los quando vagos) – efetivos ou comissionados -, funções e gratificações, e reorganizar fundações e autarquias. Um razoável problema, diga-se de passagem, na medida em que decisões arbitrárias e contrarias aos interesses da sociedade e do Estado poderão ser tomadas, o que gerariam ainda maior instabilidade, política, administrativa e/ou de gestão (13).
 
Além disso, a proposta prevê sua implementação em três fases, sem que se saiba, exatamente, quando e como virão as outras duas (14), não facilitando as projeções sobre seus reais impactos financeiros. Essa proposta, talvez, faria sentido no início do governo, quando todos já sabiam de sua necessidade e ainda não se vislumbrava a pandemia do coronavírus e nem, tampouco, os ‘estouros’ nas contas públicas por conta dos planos emergenciais – necessários, enfatize-se – diante da pandemia instalada no Brasil.
 
Em resumo, buscando dar maior poder ao presidente da República e apenas alterando as regras de contratação e demissão dos futuros servidores (15), a proposta apresentada pelo ministério da economia protege os atuais funcionários, evita que ocorram mudanças em suas carreiras e mantêm os privilégios das classes ‘mais privilegiadas de setor público’ e, como já citado, principalmente aqueles que trabalham nos poderes judiciário e legislativo. Não é o caso dos professores, varredores, administrativos do executivo, médicos e demais servidores das áreas de saúde e educação, por exemplo. 
 
Se o Brasil, como a maioria dos países nos quais o ‘poder público’ (os três poderes) às vezes ignora valores democráticos e ultrapassa os limites de sua autoridade, colocando seu interesse acima dos interesses da sociedade, pois estabelece regras unicamente para proteger seu corpo de funcionários (nem todos é verdade), base no qual está assentado seu próprio poder, levando o Estado a ter gastos com pessoal altíssimos e incompatíveis com os serviços que presta e com as receitas que tem, uma reforma administrativa que busque resolver esses problemas torna-se imprescindível, pois como escreveu Ana Carla Abrão, em artigo já citado, “a reforma administrativa não é contra o servidor público. É a favor do Brasil”. Mas ela precisa ser feita para valer e discutir o que se quer do Estado brasileiro (O QUE) e de que forma e com quais instrumentos (COMO) é possível realiza-la. Qualquer ônus político correspondente tem que ser assumido pelos nossos governantes (16), caso contrário será mais um instrumento de marketing político, perda de tempo, empulhação e uma ‘nuvem de fumaça’ para desviar a atenção das discussões essenciais. 
 
(1) “Portanto, se por um lado é necessário gastar mais para combater a pandemia, e ainda para manter nossa população em condições mínimas de sobrevivência, e isto parece ser inegociável neste País ‘pobre e cada vez mais carente’, algo precisaria ser feito de forma mais urgente, objetiva e concreta. Mas que, como pode ser constatado, e lamentavelmente, são providências que aparecem bem nos discursos mas ficam, como sempre, pelo caminho. Principais exemplos: a) privatização, como forma de diminuir gastos do governo e realizar ‘entradas extraordinárias de caixa’, mesmo que não seja o R$ 1 trilhão prometido; b) corte de parte dos subsídios, do financiamento subsidiado e desonerações fiscais/tributárias cujos resultados são ‘incertos’ ou ‘desconhecidos’ (entre 2003 e 2018 foram aproximadamente R$ 4,5 trilhões); c) reforma administrativa, como forma de desburocratizar a administração pública e economizar recursos exageradamente gastos com pessoal (cerca de R$ 290 bilhões por ano); e d) reforma tributária cujo objetivos maiores deveriam ser a desburocratização, a racionalização e, prioritariamente, a diminuição da ‘perversidade’ no processo de distribuição da carga tributária, que hoje recai, principalmente, nas populações mais pobres do País. Sobre esses aspectos cabem artigos específicos”. E finalizo: “Em nenhum momento providências desse tipo, a não ser de forma oportunista, foram discutidas com profundidade e de forma imparcial. Em algumas delas o executivo nem sequer apresentou propostas e quando o fez, como no caso da Reforma Tributária, o fez de forma ridícula”.
 
(2) “Servidor público concentra 6 das 10 ocupações mais bem pagas”, foi o título do artigo publicado pela Folha de São Paulo, dia 25.08.20. Ainda, segundo o artigo, quatro dessas ocupações fazem parte das 5 TOP. E segue o artigo: “Membros do Poder Judiciário, além de diplomatas, só perdem em remuneração para donos de cartórios, com renda média mensal acima de R$ 100 mil”. Segundo especialistas, a vantagem salarial e a estabilidade do funcionalismo legitimam mecanismos temporários de redução de carga horária e de vencimentos em caso de ameaça de descumprir o teto de gastos. No plano federal, isso poderia abrir espaço anual de R$ 15 bilhões no Orçamento. Sob a Covid-19, enquanto os servidores foram preservados, mais de 16 milhões de brasileiros tiveram cortes de 25% em seus salários.
 
(3) Segundo o próprio IPEA, o Estado brasileiro é muito mais responsável pelo aumento da desigualdade social no País do que o setor privado. Segundo dados do IPEA, no topo da pirâmide social (aqueles que ganham mais de 20 salários mínimos, estão 2/3 dos funcionários públicos federais. Entre os mais ricos, os funcionários públicos federais são 83%! 94% dos federais estão entre os 40% mais ricos. No caso dos Estaduais são 89% e nos Municipais 66%. 
 
(4) Como já defendido pela jornalista e economista Ana Carla Abrão em artigo publicado no Estadão de 18.02.20, “a realidade aqui é o de sistemas obsoletos, equipamentos ultrapassados e uma enorme dificuldade de se ganhar transparência e rapidez nos processos”. “Segue-se daí todo um sistema de governança fraco – quando não inexistente”. Prossegue Ana Carla: “não se trata mais de não conformidade e sim de ausência de um mínimo de governança que garanta que os processos decisórios sejam corretos, transparentes e coerentes com os planos e resultados almejados pelas políticas públicas”
 
(5) Por exemplo: Raul Velloso, profundo conhecedor das finanças do Estado, tem dito que “os dados fiscais mostram que os gastos com servidores da ativa não são o grande problema das contas públicas. Desde 2011, pelo menos, as despesas totais com pessoal têm sido pressionadas pelo aumento acelerado dos gastos com os aposentados (5.1), enquanto o pagamento aos funcionários ativos está mais ou menos controlado (grifos meus). E a reforma da Previdência não resolveu o rombo provocado pelos gastos já elevados com servidores aposentados”. Vale à pena conferir.
 
(5.1) Dados do IBGE e do IPEA, dão conta que em 15 anos (2004 a 2018), o déficit da Previdência Social do Setor Público, chegou a R$ 1.300 bilhões (para cerca de um milhão de pessoas), enquanto que o déficit do INSS (30 milhões de pessoas), não ultrapassou dos R$ 450 bilhões. Enquanto nesse período, cada servidor público gerou R$ 1,3 milhão de déficit para a previdência, o trabalhador no sistema INSS gerou déficit de R$ 15 mil (87 vezes menos!!!!!).
 
(6) “A apresentar um projeto que veda pontos imorais como férias de 60 dias ou aposentadoria compulsória como punição para atingir quem não os tem e deixar de fora aqueles que os têm é, no mínimo, contraditório. Ou não, afinal esse é um dos pontos que confirma a percepção de que as condicionalidades impostas pelo presidente da República para o envio da PEC ao Congresso reflete as suas preferências pessoais, em detrimento de conceitos técnicos relevantes” (grifos meus), escreveu Ana Carla Abrão no Estado do último dia 8.
 
(7) A proposta garante estabilidade e salários fixos para os funcionários das chamadas ‘carreiras de Estado’. Embora haja a necessidade de uma lei complementar que as defina, segundo informações do próprio governo, essas carreiras são as dos diplomatas, auditores fiscais, servidores das Forças Armadas, do Banco Central, da Receita Federal, da Política Federal e da Política Rodoviária. 
 
(8) Segundo dados do Atlas do Poder Público do IPEA, destacados no artigo “Evidências”, de Ana Carla Abrão (Estadão de 08.09.20), o poder judiciário brasileiro custa 1,4% do PIB nacional. Em Portugal, Espanha, Suíça ou Reino Unido, esse percentual é menor do que 0,4%. Entre 2011 e 2020 os gastos do poder judiciário dobrou, sendo que 90% dos gastos referem-se a salários, verbas indenizatórias e gratificações. Em 2019 os “penduricalhos”, segundo o próprio Conselho Nacional de Justiça (CNJ), alcançaram R$ 6,2 bilhões! 
 
(9) O atual Ministro da Justiça, André Mendonça, em abril deste ano, quando ainda era o ‘comandante’ da AGU, criou um impasse e uma disputa com o Ministério da Economia. É que a AGU deu um parecer que ignora o “Abate Teto” (medida que limita o valor do salário mensal no funcionalismo público, implementada em 2018) e concorda com a possibilidade de um servidor público, ao receber de duas fontes diferentes (estar na ativa nas FFAA e prestar serviços como Ministro, por exemplo), poder ultrapassar o teto salarial do funcionalismo (R$ 39,3 mil mensais).  Para que se tenha ideia de quanto isso representa, o Ministério da Economia disse que o “Abate Teto”, até agora, já economizou cerca de R$ 520 milhões aos cofre públicos.
 
(10) Licenças-prêmio, férias superiores a trinta dias por ano e remuneração extra por tempo de serviço e férias de mais de 30 dias por ano. O Estadão, de 04.09.20, publicou algumas das principais ‘distorções’ existentes atualmente: 
• Três meses de afastamento remunerado a cada cinco anos trabalhados. Na União, foi extinta em 1997, mas ainda existe em muitos Estados e municípios.
• Aumentos retroativos. Leis já concederam reajustes salariais retroativos, como no caso das polícias do Distrito Federal, beneficiadas por MP editada pelo governo federal em maio concedendo aumentos retroativos a 1º de janeiro de 2020.
• Mais de 30 dias de férias. Carreiras da magistratura e do Ministério Público têm direito a férias de 60 dias por ano, enquanto demais servidores e trabalhadores do setor privado só têm 30 dias.
• Aposentadoria compulsória como punição. Servidores públicos hoje podem se aposentar de forma compulsória como “punição”, após serem alvo de processo investigativo que apura infração disciplinar. 
• Parcelas indenizatórias sem previsão legal. Administração pública só poderá pagar auxílios ou diárias previstas na lei, sem espaço para criação de penduricalhos por conta própria.
• Redução de jornada sem redução de remuneração, salvo por saúde. Ainda há situações em que o servidor é beneficiado com redução de jornada sem nenhum corte em seu salário.
• Progressão ou promoção baseada exclusivamente em tempo de serviço. Algumas carreiras hoje preveem avanço do servidor nos degraus da carreira conforme o tempo de serviço, sem avaliar necessariamente seu desempenho.
• Incorporação ao salário de valores referentes ao exercício de cargos e funções. Algumas carreiras ainda podem incorporar gratificações após o servidor permanecer determinado tempo mínimo num cargo ou função, o que não será mais permitido na nova estrutura.
 
(11) “Classificados como “agentes públicos”, e não servidores, estão: deputados, senadores, magistrados, procuradores, promotores e ministros de tribunais, já que o Executivo não pode determinar a organização e as regras para Legislativo e Judiciário, onde se concentram caríssimos “penduricalhos” que eu, tu e nós pagamos. Como férias de 60 dias” (Eliane Cantanhêde, no artigo “Guerra aos penduricalhos”, publicado pelo Estadão dia 4 pp).
 
(12) Dados de 2013, da OCDE, mostram que seus 34 países, na média, tem 19,3% de funcionários públicos com relação à sua Força de Trabalho. Esse percentual, no Brasil é de apenas 11,4. Em 2015 esses percentuais passaram para 21% e 12%, respectivamente.
 
(13) Como escreveu Eliane Cantanhêde em artigo aqui já citado: “se, com as atuais restrições, o presidente já pode fechar o Ministério da Cultura, por exemplo, imaginem com um super poder para moldar a administração federal ao seu gosto ideológico?”
 
Escreveu Cláudio Couto, cientista político e professor do mestrado em Gestão e Políticas Públicas da FGV: “Esse tipo de coisa (extinção de órgãos sem aval do Legislativo) seria desastrosa para a administração pública. Produziria uma instabilidade muito grande e daria espaço para um governante arbitrário tomar decisões perigosas para o Estado e a sociedade brasileira”. Já a professora Regina Pacheco (Escola de Administração de Empresas da FGV/SP) acredita que “o Congresso não vai dar esse poder ao presidente. Não acho razoável, inclusive.”
 
(14) Segunda fase: tratará da gestão do desempenho e da regulamentação que consolida cargos, funções e gratificações, diretrizes de carreiras, modernização de formas de trabalho, arranjos institucionais e ajustes no estatuto do servidor. Fase 3: chamada de o “Novo Serviço Público”, criará um novo marco regulatório das carreiras (governança, direitos e deveres do servidor).
 
(15) Os novos servidores, agora ‘sem estabilidade’ e diferentemente do que ocorre com os atuais, ao serem avaliados desde o início, precisarão mostrar bom desempenho na execução do cargo público, sob risco de serem demitidos. 
 
(16) No mês de abril passado, por ocasião das discussões a respeito do congelamento de salários do funcionalismo público, como possível contrapartida para a concessão de recursos a Estados e Municípios, o presidente Bolsonaro, para não se indispor com sua base de apoio, preferiu não fazer e “empurrou” o assunto para o Congresso. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que também não quis ficar com esse ônus, avisou: “o Parlamento não pode ser utilizado como barriga de aluguel”. Deu no que todos já sabemos: ao contrário dos milhões de trabalhadores do setor privado, os salários não foram congelados.
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