Na atual situação do Brasil, muitas providências são necessárias. Mas o combate ao desemprego, além de essencial, é medida de sobrevivência*

Publicado em
27 de Maio de 2019
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No final do ano passado, ao enfatizar que os problemas econômicos precisavam ser ‘encarados’ de frente (“Economia Já!”, foi o nome do artigo publicado em 10.10.18 aqui mesmo no Guia do TRC), eu comentei que ao se aproveitarem “de um momento no qual os problemas éticos, de costume ou culturais passaram a ter prioridade, Bolsonaro e Haddad, assim como todos os demais candidatos à presidência da República, com exceção de Marina Silva e Geraldo Alkmin, não fizeram o menor esforço para apresentarem propostas no campo econômico”. Estava claro naquela oportunidade que “ao se limitarem a pequenos resumos de seus programas de governo, deixaram de lado as discussões sobre Políticas de Estado”. 

O fato é que naquelas eleições, apesar da crise, os problemas econômicos foram muito menos discutidos do que aqueles ligadas à ética, ao moralismo e aos costumes. Era falar o que os eleitores queriam ouvir e a economia, como se sabe, não é assunto “angariador” de votos. Além das propostas de sempre -  inconsequentes e geralmente irrealistas – qualquer atitude que pudesse implicar em maiores sacrifícios para a sociedade (trabalhadores ou empegados), e portanto perda de votos, nem sequer eram discutidas.

Particularmente, meu maior temor dizia respeito aos altos índices de desemprego, uma vez que isto aumentaria as pressões da sociedade e, em consequência e mesmo considerando o crédito de um novo governo, geraria muita instabilidade política. Hoje são mais de 3 milhões de desempregados – de um universo de 13,4 milhões – procurando emprego há mais de 2 anos em todo o Brasil. E, como salienta o coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo, diminuindo ainda mais a produtividade brasileira, pois “no momento em que o trabalhador vai se afastando da qualificação, a capacitação vai se desfazendo ou ficando obsoleta”. Como sabemos todos, a baixa produtividade de nosso setor produtivo, já há algum tempo, é um dos graves problemas brasileiros.

Como tenho insistido, não cabe mais essa “irritante e burra” oposição entre dirigismo estatal extremo e ampla e irrestrita liberdade econômica. Não há porque insistir no incorreto pensamento de que, de um lado existe um Estado corrupto, ineficiente, burocrata, que tira recursos dos setores produtivos e presta péssimos serviços à população e, de outro lado, há um mercado só de qualidades, totalmente capacitado, alta produtividade e sempre comprometido como o progresso geral”. É fundamental que se trabalhe com a razão e a visão de progresso, que somente será conseguido via debates e negociações sérias e responsáveis, nas quais não há de prevalecer o interesse particular, mas sim os interesses da nação. 

E se o caminho para o Brasil sair da crise precisa ser construído à partir da Política (com P maiúsculo), com base na reestruturação da economia brasileira, no equilíbrio das contas públicas e na geração de empregos, continuar negando a Política e alimentar o ódio e separar o País entre “nós e eles”, transformando adversários políticos em inimigos, em nada contribui e ainda gera riscos que o Brasil não deve e nem precisa correr. 

É óbvio que as incertezas do cenário internacional também contribuem para que o ‘quadro seja ainda mais sombrio’, mas sem dúvida é a inabilidade política deste governo o que mais tem criado problemas. Assim como dezenas de outros exemplos semelhantes, as recentes passeatas a favor da Educação, independentemente de que as promoveu, tiveram maior repercussão do que deveriam em função das infelizes declarações dadas por membros do executivo brasileiro, inclusive do próprio presidente que, ao invés de dar explicações sobre a necessidade de se “contingenciar” verbas, transformou uma discussão eminentemente técnica em discussão ideológica. É claro que a “turma do Twitter” aproveitou e fez o resto.

No Brasil real, infelizmente, as notícias não são boas, pois o PIB do primeiro trimestre deste ano, quando comparado com o mesmo período do ano passado é negativo. E o desemprego, que já era alto, continua aumentando. Mesmo considerando a melhoria obtida durante os dois anos do governo Temer, se comparamos os resultados da economia brasileira desde que se iniciou a crise, no início de 2014, com o início deste ano, os resultados são alarmantes. É clara a “involução” do PIB se compararmos o primeiro trimestre de 2014 com o primeiro trimestre de 2019: queda de 4,9%. O PIB per capita, por sua vez, e segundo dados publicados pelo Estadão, no mesmo período teve queda de 8,8%. Segundo Afonso Celso Pastore, em reportagem do Estadão do último dia 20 (matéria da jornalista Luciana Dyniewicz) somente alcançaremos o PIB per capital de 2013 em 2026. E isto se a economia crescer acima dos 2%! A expectativa para este ano – a 12ª projeção de queda – é de 1,4%, isto é, menos da metade da expectativa de crescimento médio mundial! De fato estamos muito mais pobres e perdemos, no mínimo, 13 anos! 

É óbvio que com um PIB crescendo pouco, a correspondente arrecadação de impostos também tem crescimento comprometido. Essa queda na arrecadação e o continuado aumento de gastos (avaliação do IFI, Instituto Fiscal Independente, órgão de assessoria do Senado Federal, estima que em 2022 o governo não conseguirá cumprir o Teto de Gastos), tem mantido déficits nos resultados primários e nominais e, consequentemente, aumentado a dívida pública. Se antes era possível estimar uma dívida crescente somente até o ano de 2023 ou 2024, cujo valor seria equivalente a cerca de 83% do PIB, agora as estimativas já indicam que o nível da dívida pública poderá chegar ao máximo de 86% em 2025, para só depois começar a declinar. 

Como já comentado algumas vezes, eu jamais imaginei outros resultados para o desempenho da economia brasileira neste e no próximo ano, independentemente do governo de plantão, pois a situação “está feia” e não há ‘varinha mágica’. Assim como a própria reforma da Previdência que, volto a insistir, é condição necessária, mas não suficiente. Como disse o professor Marcos Lisboa, presidente do Insper: “havia a expectativa de que uma grande reforma destravaria o País e ele voltaria a crescer de dois a três pontos por ano. Agora, o mercado deixou a Disneylândia para encontrar a realidade (grifos meus). 

A economista-chefe do XP Investimentos, Zeina Latif, em artigo publicado pelo Estadão no último dia 16 (“Cuidado com a lei de Murphy”), escreveu de forma correta e clara: “A cautela na condução da política econômica e o senso de urgência no avanço de reformas precisam ser redobrados”. “Uma economia estagnada pode cair facilmente em recessão, pois é mais vulnerável a acidentes de percurso”. E concluiu: “O que discuto é que uma economia fraca acaba sendo gatilho para eventos desfavoráveis que agravam o quadro. Por exemplo, a insatisfação popular pode engrossar paralisações e greves, que machucam as finanças e a confiança de empresários e consumidores (grifos meus). Outro exemplo: a frustração com a arrecadação compromete a oferta de serviços públicos e programas de transferência de renda, e também alimenta a percepção de risco fiscal pelos investidores (grifos meus). Nesse contexto, qualquer volatilidade no exterior acaba potencializando o contágio doméstico, aumentando as incertezas do cenário econômico”.

Plagiando Zeina Latif, o que discuto é que além de “machucar as finanças e a confiança de empresários e consumidores e alimentar a percepção de risco fiscal pelos investidores, e consequentemente as incertezas do cenário econômico”, a continuidade desta crise e a manutenção do nível de desemprego – e desencanto – em índices alarmantes como os atuais, machuque o cidadão brasileiro (ainda mais), levando-o à total falta de perspectivas. E isso é perigoso.
Em determinada ocasião eu ouvi muitos empresários e analistas dizendo e escrevendo que, mesmo contrariando o que estabelece a Constituição brasileira, o combate à corrupção não deveria ser mantido da forma como estava até então, posto que a prioridade deveria ser combater o déficit fiscal e controlar a inflação.

Sem dúvida, objetivos importantes para quaisquer economias. Segundo esses analistas e empresários, as “intermináveis investigações de combate à corrupção” só aumentariam a crise econômica e inibiriam ainda mais os investimentos. Pergunta análoga que faço no momento: até que ponto o combate aos gastos públicos e o controle da inflação devarão ser perseguidos? Até o ponto de ‘machucar’ ainda mais a grande maioria do povo brasileiro? Ou o “arrocho econômico” nada tem a ver com o caos instalado no Brasil? Sempre será preciso escolher entre um ou outro? Não é possível um e outro.  

Ao responder à Comissão Mista de Orçamento do Congresso, o presidente do Banco Central do Brasil, Roberto Campos Neto, acredita que a melhor forma de fazer a economia crescer é ter a inflação controlada. Segundo ele “não se deve, no atual momento, trocar inflação controlada por crescimento de curto prazo”, insustentável num futuro muito próximo. Há um razoável contingente de economistas que também defendem esse mesmo ponto de vista e recorrem aos exemplos japonês e europeu, nos quais as taxas de juros estão próximas de zero (algumas até mesmo negativas), sem que o esperado crescimento apareça. É verdade. Mas é verdade também que esses Países, muito mais estruturados e sem a necessidade de fazer tantas reformas, já possuem uma rede de proteção social muito superior do que a existente neste País, mantendo sua população em uma situação de razoável dignidade. Não é o que se vê no Brasil atualmente.
Como disse o economista-chefe do Banco Votorantim, Roberto Padovani, em entrevista para a jornalista Luciana Dyniewicz (Estadão de 20.05.19), quando “há uma diversidade de diagnósticos é porque ninguém está entendendo direito o que está acontecendo – o que é raro de se ver”. De fato, parece-me que somente as incertezas tem tido unanimidade nestes últimos anos.

O ex-diretor do Banco Central, Alexandre Schwartsman, por exemplo, diz que o único caminho para que se reative a economia, no momento, é o corte de juros. Já Zeina Latif defende que a utilização da política monetária para a retomada do crescimento econômico trará resultados muito pequenos, além de perda de confiança do mercado. Mesmo considerando, como apontam os estudos correspondentes, que a inflação não deverá aumentar no curto prazo?

Portanto, sem viés ideológico e de forma honesta e objetiva, é necessário retomar as discussões relativas as Políticas de Estado, nas quais aquelas voltadas ao estímulo e à geração de empregos, obrigatoriamente, precisam estar incorporadas 

Ao invés disso, o governo Bolsonaro, sempre envolvido em algum problema de comunicação (errada, fora do tempo ou do contexto, mal feita, mal interpretada ou inapropriada), não consegue “ganhar uma” no Congresso. Até porque a grande maioria das medidas provisórias e decretos propostos por Bolsonaro, em menos de cinco meses de governo, tem mais de 30 contestações junto ao STF, conforme levantamento feito pelo Estadão. “A técnica jurídica do governo deixa a desejar, pois muitos deles deveriam, antes, passar pelo Congresso” disse o professor de direito da FGV, Oscar Vilhena.

Mas isso não parece ser problema para nossos governantes – em todos os poderes e em todas as esferas de poder – pois somente se discute, e se aprova, o que é de única e exclusiva conveniência para eles. Talvez por esse motivo e que a maioria deles aparece em fotos, sempre felizes e rindo muito. É o que se vê no momento em que assinam medidas que estejam de acordo com suas crenças, seus valores e interesses muito particulares. O decreto que liberou a importação e ampliou o mercado de armas no Brasil é um bom exemplo. Outro exemplo ocorreu ainda no último dia 17, quando foi sancionada a lei que autoriza o cancelamento das multas aplicadas a partidos políticos (cerca de R$ 70 milhões de multas que foram aplicadas porque, ao contrário do que estabelece a Lei dos Partidos Políticos, a maioria não aplicou, entre 2010 a 2018, os 5% de verbas do Fundo Partidário destinados a promover a participação políticas das mulheres).

Ainda recentemente, também sorridentes, apareceram diversos políticos, dirigentes e representantes da alta sociedade brasileira em importante evento realizado na cidade de New York. No seminário promovido pela Lide, os presidentes da Câmara, do Senado e do STF, muito “camaradas” entre si, disseram que os três poderes estão unidos e à favor de uma economia mais liberal. O empresário e presidente do Lide, Luiz Furlan, segundo o Estadão, disse que “há anos não vejo os poderes se tratarem tão afavelmente”. Não sei porque a senadora Soraya Thronicke, do próprio partido do presidente, o PSL, insiste em dizer (afirmou isso a O Antagonista) que “não falta governabilidade, falta é caráter daqueles que se comprometeram ou se beneficiaram de alguma forma com o nosso presidente”. Ela critica principalmente o DEM, que tem três ministros e os presidentes das Casas Legislativas, Câmara e Senado. Talvez, assim como eu, ela precise participar de uma festa desse tipo ou começar a ler notícias de veículos mais imparciais. Definitivamente, não dá para entender.

A situação econômica brasileira exige muitos cuidados, sem dúvida, e por mais que o brasileiro “drible” a falta de emprego, reinventado sua profissão, criando novas alternativas ou partindo para o empreendedorismo – aliás muito divulgado hoje em dia como solução para tudo - o desemprego precisa começar a diminuir, pois do caos ao anarquismo o caminho é muito rápido. 

O governo – todo ele – precisa trabalhar seriamente e encarar de frente os reais problemas brasileiros, agindo principalmente para implementar medidas realistas e compatíveis com os problemas nacionais atuais. São inegociáveis os compromissos pela recuperação econômica e pela defesa da Democracia e do Estado de Direito, assim como providências que combatam o desemprego, drama que aflige uma percentagem cada vez maior da população brasileira. E o mais urgentemente possível, pois como comprovam os noticiários, pelo menos aqueles que vejo, no caos nós já estamos. 

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