Não foi a Intermodal? Leia aqui um resumo do que aconteceu, por Paulo Roberto Guedes*

Publicado em
11 de Abril de 2017
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Na semana passada foi realizada, aqui em São Paulo, no Transamérica Expo Center, a XXIII Intermodal South América que, agora organizada pela UBM Brazil, e apesar da crise atual pela qual passa nosso País, contou com cerca de 400 diferentes empresas (armadores, portos nacionais e estrangeiros, terminais, operadores logísticos, etc) e um número significativo de especialistas e visitantes (25.000 foi o público total). Eles entendem, mais do que isso, acreditam que o Brasil é uma região na qual suas atividades poderão ser expandidas.

É comum dizer que eventos como esse são essenciais para a divulgação de novas ideias, novos produtos e tendências de um determinado setor da atividade econômica. Bem como, vale dizer, permitir que representantes governamentais, empresários, investidores e empreendedores, inclusive de países estrangeiros, identifiquem novas oportunidades de negócios. Eventos desse tipo, sem dúvida, estimulam o relacionamento com clientes e a prospecção de novos empreendimentos.
E foi o que aconteceu na XXIII Intermodal, feira especializada na discussão da logística, do transporte e do comércio exterior quando, a meu ver, proporcionou importantes e profícuos encontros entre os vários representantes do setor. 

Se na abertura do evento, representantes do governo brasileiro e de países estrangeiros (1) enalteceram as relações comerciais internacionais, em especial com o Brasil, as palestras e as conferências realizadas durante o evento constataram a importância da logística como facilitadora do comércio e do aumento da produtividade e da competitividade das nações.

Por seu lado, a feira, propriamente dita, embora menor do que a de anos anteriores, apresentou uma quantidade satisfatória de empresas – de operadores logísticos a armadores, de terminais portuárias a empresas de tecnologia em logística, de empresas de segurança a empresas de transporte e de entidades que estudam a logística e o comércio exterior à academia – que, por si só, demonstrou o elevado grau de confiança que esse setor mantém com relação à recuperação da economia brasileira. Até porque os investimentos, nesse setor, nunca são para o curto prazo.

As palestras e os debates realizados foram dedicados quase que exclusivamente para tratar dos chamados “gargalos logísticos”, dos altos custos do transporte e da movimentação de mercadorias, da pouca utilização da multimodalidade, dos entraves burocráticos (nas fronteiras e nas atividades empresariais voltadas ao comércio exterior) e da falta de coordenação das atividades e dos investimentos em infraestrutura logística.

Reunindo especialistas, operadores, usuários e estudiosos da logística e do ‘supply chain’, as palestras serviram para constatar que a logística é uma atividade de vital importância para governos e empresários, posto que, como é do conhecimento de todos, crescimento e desenvolvimento econômicos dependem significativamente da execução de uma logística eficaz. Ficou claro, durante todo o período no qual aconteceram as conferências e mesas de debates, que o aumento da competitividade de qualquer país, notadamente aqueles de dimensões continentais, como é o caso do Brasil, somente poderá ser obtido com a eliminação dos desperdícios, da diminuição dos chamados ‘custos operacionais desnecessários’ e da melhoria da logística e sua infraestrutura (2).

Foi demonstrado pelos vários palestrantes que lá compareceram, que o Brasil, cada vez mais distante das economias mais desenvolvidas, quando se comparam os índices que avaliam a logística (3), prima pelo excesso de burocracia, morosidade e demasiada complexidade nos sistemas atuais. A realização da maioria das atividades empresariais, principalmente aquelas voltadas ao comércio exterior, padecem, vale repetir, sempre que necessitam do apoio e do suporte dos órgãos governamentais.

Com a participação de representantes e autoridades do setor portuário brasileiro, por exemplo, ficou patente que a regulamentação dos portos é imprescindível, motivo pelo qual todos defenderam as alterações pleiteadas em projeto específico que incluem, segundo eles como imprescindível, o aumento dos prazos de arrendamentos e a desburocratização das prorrogações concedidas. Converge, a maioria das opiniões, que a diminuição da burocracia e a segurança jurídica, necessárias à promoção dos investimentos privados, somente ocorrerão quando essa revisão do marco regulatório dos portos for finalizada. 

Como foi lembrado por mim, em artigo aqui publicado no último dia 31, (“Infraestrutura logística, burocracia e comércio exterior”), “é imprescindível que o Brasil retome os investimentos, notadamente aqueles voltados à infraestrutura logística, mas sempre com a decisiva e significativa participação do setor privado” (grifos meus). E que isso somente será possível caso haja regulação e segurança jurídica para a realização dos contratos pertinentes. Citei, inclusive, artigo escrito por Arnaldo Wald e Roberto Giannetti da Fonseca, quando ambos dizem que “os contratos correm riscos legislativos, regulatórios e até judiciais”, levando o empresariado “incluir, nas suas previsões, os custos decorrentes de modificações imprevisíveis e incomensuráveis” (4).

A falta de investimentos em infraestrutura logística também foi outro assunto abordado nas conferências da XXIII Intermodal. O representante do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), engenheiro Edson Dalto, afirmou que, embora o banco tenha maiores dificuldades do que anteriormente, principalmente na captação de recursos, ele deverá continuar investindo no setor. O que se deve complementar, pelos números apresentados em sua palestra (5), é que será fundamental a participação do setor privado (6), uma vez que os investimentos do setor público, desde 2014, estão em queda. 
Arrendamentos dos terminais portuários, renovação dos contratos das concessionárias, investimentos específicos para o setor ferroviário, inclusive com a criação de novas linhas para os portos, em especial para o Porto de Santos, pois é a expectativa, para um futuro próximo, que das cargas que chegarem àquele porto, 90% deverão vir através das ferrovias, foram outros assuntos abordados nas conferências realizadas.

Para resolver os problemas de burocracia foram citadas várias providências, tais como o Portal Único do Governo (interface única entre todos os agentes do setor) que, ao redesenhar todos os processos de exportações e importações, sempre junto com o setor privado, deverá simplifica-los e racionalizá-los.
A tecnologia também foi assunto debatido no evento. Colocada como item importante no conjunto de soluções de problemas, a necessidade de se inovar, principalmente através do avanço tecnológico, ficou evidente. Não só para os aspectos de segurança, posto que os roubos de cargas aumentaram muito no País (7), mas também para racionalizar, dar maior transparência, informar e aumentar a produtividade das operações logísticas (8).  

O futuro também não ficou de fora nas abordagens feitas. A utilização de impressoras 3D, automação e robótica nos armazéns, “self-driving” e o compartilhamento econômico foram inovações citadas no evento. Por outro lado, considerando-se que os congestionamentos estão aumentando substancialmente os custos logísticos em todo o mundo (9), muito vem se pensando sobre o assunto. Exemplos: na Suécia a DHL desenvolveu, e está em processo de implantação, um aplicativo (MyWays) para facilitar a entrega de encomendas por meio dos habitantes da própria cidade; na Alemanha um outro aplicativo (Smart Drop Box) está sendo desenvolvido para monitorar o automóvel do destinatário, afim de se conseguir que um funcionário da empresa, consiga depositar a encomenda dentro do carro do destinatário, informou o representante da empresa.

Se é verdade que o mundo já alcançou o extraordinário número de sete bilhões de pessoas, não é menos verdade que a viabilização da produção e da distribuição de serviços e bens econômicos, em quantidades cada vez maiores, também constará do mapa de prioridades de governantes e empresários. E não só para atender aqueles que vêm chegando, mas também, para melhorar o nível e a qualidade de vida de todos que aqui já estão. 

Essa prioridade, inevitavelmente, exigirá maior integração econômica e operacional entre países e empresas e deverá pressionar todas as atividades comerciais – nacional e internacional –, a buscar eficácia na movimentação de volumes crescentes de pessoas e mercadorias, em distâncias cada vez maiores. A logística, portanto, precisa estar preparada!

(1)    O Ministro dos Transportes, Portos e Aviação Civil do Brasil, Sr. Maurício Quintella, participou de uma reunião com o Sr. Geert Bourgeois, Ministro-Presidente de Flandres (Região Norte da Bélgica), com o objetivo claro de reforçar as relações comerciais entre os dois países. Segundo Bourgeois, “o crescimento de nossas operações com o Brasil se deu juntamente à Intermodal. Atualmente, Flandres é responsável por 82% de todas as exportações e importações da Bélgica, e muitas delas são provenientes do Brasil ou têm como destino o país”, ressaltou a assessoria de imprensa da Intermodal.
Por outro lado, a Ministra do Mar de Portugal, Ana Paula Vitorino que também esteve presente no evento, destacou o fato de que o setor portuário e de logística são fundamentais para o Brasil, pois nós “somos a porta de entrada de produtos brasileiros na Europa e é por isso que prezamos pelas as relações entre os países”. 

(2)    O diagnóstico é conhecido quando se discutem os problemas da falta de investimentos em infraestrutura no Brasil: baixa competitividade nas licitações, baixa qualidade dos estudos e projetos, morosidade no licenciamento dos projetos, insegurança jurídica nos contratos com o setor privado, alto intervencionismo estatal e ausência de planejamento estatal de longo prazo.

(3)    De acordo com o Banco Mundial, que realiza e divulga pesquisa nesse sentido (LPI – Logistics Performance Index), os cinco países que lideraram o ranking internacional de eficiência logística são: Alemanha (4,23), Luxemburgo (4,22), Suécia (4,20), Holanda (4,19) e Singapura (4,14). As piores colocações são da  Síria (1,60), Haiti (1,72) e Somália (1,75). As notas são de 1 a 5. De acordo com o relatório do Banco Mundial, em 2007, quando o primeiro levantamento foi divulgado, o Brasil ocupava a 61ª oposição do ranking com um índice geral de 2,75, em 2014 o índice brasileiro geral melhorou para 2,94 (65ª posição) e em 2016, com índice geral de 3,09 o Brasil subiu para a 55ª oposição, à frente dos nossos vizinhos Argentina e Uruguai.

(4)    “Investimento, regulação e segurança jurídica”, artigo de Arnaldo Wald e Roberto Giannetti da Fonseca, para o Estadão no último dia 25. “Para que haja uma retomada de investimentos, inclusive na área de infraestrutura, é necessário haver uma mudança de contexto cultural nas relações entre o Estado e a sociedade civil”.

(5)    De acordo com o Engenheiro Edson Dalto, do BNDES, o banco estatal já investiu em infraestrutura, nos últimos três anos, cerca de R$ 412 bilhões (R$ 188 bilhões em 2014, R$ 136 bilhões em 2015 e R$ 88 bilhões em 2016). Desse total, dos últimos três anos, R$ 23 bilhões foram somente na logística. E continuará investindo, pois o BNDES considera o setor de infraestrutura nacional fundamental para o País. De 2017 a 2020 o banco pretende investir mais R$ 85 bilhões em infraestrutura logística nacional, sendo R$ 46,1 bilhões rodovias, R$ 28,2 bilhões em ferrovias e R$ 13,6 bilhões em portos e terminais.

(6)    O PPI (Programa de Parcerias de Investimento), instituída pela Lei nº 13.334/2016, tem como principais objetivos, melhorar e fortalecer o relacionamento entre Estado e iniciativa privada, de forma a atrair investimentos para obras de infraestrutura (rodovias, ferrovias, aeroportos, portos, geração e distribuição de energia, saneamento básico etc.). Na exposição de motivos da Lei, além da necessidade de se gerar mais empregos, a justificativa para a criação do PPI é em função da atual crise econômica, que está impedindo o Estado brasileiro de investir em obras de infraestrutura. 

(7)    Segundo a FIRJAN (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro), entre 2011 e 2016, em todo o Brasil, o roubo de cargas gerou prejuízos acima dos R$ 6,1 bilhões. Isto, evidentemente, entre outras providências, tem aumentado a busca por soluções para melhorar a segurança das operações.

(8)    Projetos de segurança e tecnologia da informação para portos e aeroportos (com muitos quilômetros de perímetro e com pouca iluminação), com sistemas de vídeo monitoramento e uso de câmeras que identificam suspeitos se aproximando de um muro ou de uma cerca e até mesmo um passageiro que avança por áreas proibidas, foram alguns dos exemplos apresentados. Sistemas que disponibilizam informações imediatas e em tempo real, possibilitando o monitoramento e a checagem da situação das entregas, carretas de transporte equipadas com esteiras motorizadas e elevadores transportadores, que carregam e descarregam mercadorias em tempos cada vez menores e a utilização de caminhões-baús inteligentes, uma vez que são programados para controlar a temperatura nas cargas refrigeradas e, caso identifique algum problema na via, recalcular a rota da viagem, são outros exemplos que, não há dúvidas, aumentam a qualidade e a segurança dos serviços logísticos prestados.

(9)    O Diretor Sênior da DHL Supply Chain, Marcius Braga, estima que os congestionamentos brasileiros, custam para o Brasil, cerca de U$ 19,1 bilhões!

 

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