Impacto da densidade das mercadorias sobre os custos do transporte

Publicado em
20 de Outubro de 2016
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Juntamente com a distância e o peso, a densidade da mercadoria constitui fator fundamental para a determinação do seu custo de transporte. 

Entenda-se por densidade (kg/m3), o valor obtido dividindo-se o peso da carga, em quilogramas pelo seu volume em metros cúbicos. O volume da carga (m3) é calculado multiplicando-se o comprimento pela largura pela altura (em metros) ocupados pela mesma. Para facilitar o cálculo do volume, existem equipamentos que pesam e cubam a mercadoria, ao mesmo tempo, de maneira dinâmica. Um exemplo é o Cargo Scan, composto de balança, aparelho de medição de volume e duas esteiras, uma de entrada, outra de saída. 

BOWERSOX e CLOSS (2001) , da Universidade do Estado do Michigan, duas das maiores autoridades mundiais em Logística, deixam claro que:
 
• Os veículos, geralmente, têm mais limitação de espaço do que de peso;

• Uma vez lotado o veículo, não é mais possível aumentar a quantidade a ser transportada, ainda que a carga seja leve ou volumosa;

• Como os custos operacionais não são substancialmente afetados pelo peso, cargas de maior densidade permitem que custos relativamente fixos do transporte sejam diluídos por pesos maiores. Como resultado, estas cargas incorrem em custos mais baixos por unidade de peso;

Mutatis Mutandis, os custos são bastante onerados por cargas de menor densidade; 

• Como resultado, estas cargas incorrem em custos mais altos por unidade de peso;

• O custo do transporte aumenta exponencialmente à medida que a densidade da carga diminui.
 
Recomendações do Manual
 
Baseado nestes princípios, o Manual de Cálculo de Tarifas e Formação de Preços da NTC&Logística recomenda que as tarifas básicas por tonelada sejam calculadas levando-se em conta cargas cuja densidade permita ao veículo completar o seu limite de peso bruto antes que se esgote a sua capacidade volumétrica. 

Se isso não ocorrer, o veículo vai completar sua lotação volumétrica antes que sua capacidade em peso seja alcançada. Ou seja, o custo da viagem, que se mantém praticamente o mesmo, deverá ser coberto por um número menor de toneladas transportadas. Isso encarecerá o custo por tonelada, que será onerado por uma espécie de tonelagem virtual ou não aproveitada.

O coeficiente de acréscimo de cubagem, pelo qual se multiplica o frete normal ou a tonelagem, deve ser calculado da seguinte forma:
 

CA = Coeficiente de acréscimo (multiplicador)

DI = Densidade ideal em km/m3

DP = Densidade do produto a ser transportado em kg/m3


Existe, para cada veículo ou mesmo categoria de veículos, uma densidade ideal, que corresponde à capacidade de carga líquida dividida pelo volume do compartimento de carga.  Assim, por exemplo, um veículo trucado com capacidade para 15 t de peso e 50 m3 de capacidade volumétrica terá densidade ideal de 300 m3. Da mesma forma, uma carreta para 27 t  de peso e  90 m3 de volume terá densidade ideal de 300 kg/m3.


No caso da transferência, são usados principalmente carretas de três eixos e caminhões trucados.  Tradicionalmente, a NTC adota para esta operação o valor de 300 kg/m3 como densidade ideal, ou seja, aquela capaz de maximizar tanto o peso quanto o volume transportados.  Os valores do fator de cubagem para esta densidade ideal estão na tabela 1 e no gráfico 1.
 

Tabela 1 – Fatores de cubagem,

para densidade ideal de 300 kg/m3

Densidade (kg/m3)

Fator de cubagem

Densidade (kg/m3)

Fator de cubagem

1

300,00

90

3,33

2

150,00

95

3,16

3

100,00

100

3,00

4

75,00

105

2,86

5

60,00

110

2,73

6

50,00

120

2,50

7

42,86

130

2,31

8

37,50

140

2,14

9

33,33

150

2,00

10

30,00

160

1,88

15

20,00

170

1,76

20

15,00

180

1,67

25

12,00

190

1,58

30

10,00

200

1,50

35

8,57

210

1,43

40

7,50

220

1,36

45

6,67

230

1,30

50

6,00

240

1,25

55

5,45

250

1,20

60

5,00

260

1,15

65

4,62

270

1,11

70

4,29

280

1,07

75

4,00

290

1,03

80

3,75

300

1,00

85

3,53

Mais de 300

1,00


Para facilitar os cálculos, deve-se sempre calcular o peso cubado, ou seja, multiplicar o volume da mercadoria em kg/m3 por 300 kg e não pela sua densidade real.
 

Densidade ideal
 

BOWERSOX e CLOSS (2001) enfatizam que os esforços das indústrias para aumentar a densidade das cargas mais leves resultam em custos de transportes mais baixos. No entanto, a redução da densidade constitui tendência mundial das duas últimas décadas. Isso gerou uma tendência paralela de se elevar a capacidade volumétrica dos caminhões novos. O movimento ECR, por exemplo, especifica carretas para 30 pallets, com 2,65 m de altura e cerca de 15,30 m de comprimento, cuja capacidade supera 97 m3.  Da mesma forma, o aumento do limite do comprimento total dos caminhões trucados, de 12 m para 14 m, pela Resolução 12/98 do Contran, permite carroçarias com mais de 60 m3 de capacidade.
 

Além do mais, as próprias transportadoras costumam adaptar a capacidade volumétrica dos seus veículos à densidade média das cargas transportadas. Um bom exemplo é o uso de carreta de apenas dois eixos para o transporte de cargas fracionadas.
 

A renovação da frota comercial, no entanto, tem sido muito lenta. Segundo levantamento do Geipot, mais de 72% dos caminhões continuam tendo mais de dez anos de idade. Já o acréscimo de comprimento das carroçarias foi compensado pelo aumento da tonelagem dos caminhões.
 

Por isso, a NTC decidiu manter, em seu Manual, a densidade tradicional de 300 kg/m3. Isso não impede que cada transportadora defina a sua própria densidade ideal, com base não apenas na cubagem dos equipamentos que utiliza, como também na possibilidade de compensar o grande volume de cargas leves com mercadorias mais pesadas (lastro).
 

Esta compensação pode ocorrer, por exemplo, no transporte de carga fracionada. No entanto, como este tipo mercadoria tem, no seu conjunto, baixa densidade média (cerca de 200 kg/m3), nem sempre será possível evitar-se a aplicação do fator de cubagem.
 

 No caso das transportadoras de lotação, a compensação é mais difícil, tornando-se impossível quando se carrega o veículo com um só produto, de baixa densidade.
 

No caso da carga líquida, os tanques devem ser dimensionados levando-se em conta a densidade real do produto e a carga líquida, sem a tolerância legal de 5%, para que possam trafegar praticamente cheios. Isso não só aumenta a estabilidade e a segurança do veículo como dispensa a aplicação do fator de cubagem. No entanto, se o veículo for usado para transportar uma carga de menor densidade, será necessário utilizar o fator de correção de cubagem.
 

Opcionalmente, pode ser negociada, no caso de lotações, uma tarifa por viagem, cuja validade independerá da tonelagem transportada e da densidade da carga. Ou ainda uma tarifa por m3, que resultará da divisão do custo por viagem pela capacidade volumétrica do veículo (e não pela capacidade em peso).
 

Se, por exigência do cliente, a mercadoria transportada não ocupar todo o espaço, mas for a única carga transportada (caso de um automóvel transportado sozinho no baú), o frete deve ser cobrado pela capacidade total do compartimento, ou seja, a receita deve ser suficiente para cobrir o custo total da viagem.
 

Os exemplos da carga áerea e dos correios
 

Diga-se que esta cobrança adicional para cargas de baixa densidade não é exclusividade do transporte rodoviário de cargas. O transporte aéreo adota, no mundo inteiro, raciocínio idêntico, a partir de uma densidade mínima de 167 kg/m3 ou volume máximo de aproximamente 6.000 cm3/kg. Este valor baseia-se na relação peso/volume específica para aviões, naturalmente, menor do que a mesma relação para veículos rodoviários.

A insuspeita Empresa Brasileira de Correios e Telegráfos também cobra o acréscimo de cubagem no transporte de encomendas, limitando a 4.800 cm3 o volume máximo por quilo, o que corresponde à densidade mínima de 208,33 kg/m3, bastante adequada para o transporte desse tipo de meradoria.

 

Legislação desnecessária
 

Inexiste qualquer legislação que oficialize a cobrança dos custos de cubagem. No entanto, trata-se de prática mundial, chamada de curb-out pela literatura norte-americana. Tal procedimento, não só é recomendado no Brasil pelos órgãos técnicos da NTC&Logística, desde a sua fundação, em 1963, como também praticado pela maioria das nossas filiadas e, geralmente, bem aceito pelos Órgãos Públicos.
 

Além disso, por se tratar de fenômeno dos mundos da Física e da Micro-economia, o impacto da densidade das mercadorias nos custos do transporte, a exemplo da Lei da Gravidade e da Lei da Oferta e da Procura, independe da vontade do legislador, o que dispensa qualquer legislação sobre o assunto.
 

Para não ser deficitária, cada viagem precisa ser remunerada pelo frete da carga líquida transportada. Se 2 t de carga volumosa lotam um veículo cuja capacidade é de 10 t, não resta dúvida de que, para preservar o equilíbrio econômico e financeiro da viagem, cada tonelada deve pagar cinco vezes o preço normal, pois não há como acomodar no mesmo veículo as 8 t faltantes.
 

Conclusão
 

Em suma, a cobrança da cubagem das mercadorias nada tem de abusiva ou ilegal. Pelo contrário, enquadra-se pefeitamente não só nas diretrizes técnicas da NTC&Logística sobre cálculo de fretes como também nos conceitos teóricos e nas práticas tanto nacionais quanto internacionais dos mercados do transporte de cargas de todas as modalidades.
 

[1] BOWESOX, D.J. e D.J. KLOSS (2001, pg. 304 e 305), “Logística Empresarial”, Editora Atlas, São Paulo.
 

Neuto Gonçalves dos Reis
Diretor Técnico Executivo da NTC&Logística, membro da Câmara Temática de Assuntos Veiculares do CONTRAN e presidente da 24ª. JARI do DER-SP.
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